terça-feira, 15 de março de 2011

Japão, e eu com isso? Terremotos, tsunami etc. podem trazer nova crise econômica mundial, afetando Brasil

Efeito Japão na economia global

 
Economia
 
Estragos do terremoto podem dificultar recuperação mundial e afetar "commodities"

Clarice Spitz, Henrique Gomes Batista,
Eliane Oliveira e Patrícia Duarte


O forte terremoto que atingiu o Japão ontem vai abalar a fraca recuperação econômica mundial e poderá ter impactos no Brasil, preveem analistas. O país, que recentemente perdeu o posto de segunda maior economia global para a China, já tinha registrado uma queda de 0,3% no seu Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos) no último trimestre. Porém, o Japão ainda é um importante motor da economia global, sendo o quarto maior importador do mundo, com um PIB que supera os US$5 trilhões. Os efeitos já foram sentidos ontem nos mercados, com queda nos preços das principais commodities. Segundo analistas, os impactos serão sentidos na indústria - sobretudo de alta tecnologia -, no comércio mundial, nos investimentos e no setor financeiro, como o de seguros, que deverá pagar apólices que somam mais de US$50 bilhões.

Embora ainda seja cedo para avaliar a extensão dos estragos, o Brasil poderá sofrer, afirmam especialistas, com um cenário de menor crescimento global que afete as exportações de produtos básicos. E que pode frear investimentos japoneses no país. O Japão foi, em 2010, o sétimo principal investidor no setor produtivo brasileiro.

- É uma péssima notícia do ponto de vista econômico. Como o Japão vinha de uma recuperação, qualquer que seja o impacto para a economia japonesa é um fator a mais de incerteza para a recuperação da economia mundial - avaliou o economista Antonio Corrêa de Lacerda, da USP. - A economia japonesa ainda é uma das maiores do mundo. É uma economia forte na parte industrial-tecnológica e que demanda muitas matérias-primas. Se sofrer um baque, o efeito maior é afetar os preços das commodities.

O economista e professor da UFRJ Luiz Carlos Prado também vê a interrupção da trajetória de recuperação da economia japonesa e mudanças no câmbio:

- O efeito provável desse terremoto é que as empresas e os bancos japoneses que têm ativos no exterior vão repatriá-los para fazer face a eventuais reconstruções. Isso deve apreciar o câmbio (valorizar o iene).

Prado lembra que isso ocorreu após o terremoto de Kobe, em 1995. Na ocasião, a apreciação do iene contribuiu para alterar as condições econômicas da região, já que outros países, como Tailândia, mantiveram seu câmbio desvalorizado para estimular a exportação, o que acabou tendo efeito indireto na crise asiática de 1997. Ontem, a moeda japonesa avançou 1,4% frente ao dólar, para 81,84 ienes.

Seguros custarão US$50 bilhões

O presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), Luis Afonso Lima, afirma que a maior consequência imediata no Brasil pode ser a interrupção de investimentos diretos já anunciados, como o feito pela Toyota no ano passado, com a previsão de mais uma fábrica, no valor de cerca de US$600 milhões. A empresa informou ontem, em nota, que ao menos quatro de suas fábricas no Japão foram diretamente afetadas e que ainda estava fazendo um levantamento para saber o impacto do terremoto em seus fornecedores.

- Desde 2008, houve uma parada tática de investimento japonês no Brasil, por conta da crise. No segundo semestre do ano passado, houve um início de recuperação. O prejuízo desse evento não esperado é uma segunda parada desse movimento de recuperação. O mercado de capitais acaba se ressentindo dos efeitos secundários do terremoto, pode haver uma postergação de investimentos - disse Lima.

Outro impacto imediato será no mercado de seguros. A economia japonesa é bem coberta por esse serviço, e o impacto do pagamento dessas apólices deverá fazer com que as empresas fiquem mais avessas ao risco e aumentem suas taxas em todo mundo, inclusive no Brasil. Paul Conolly, da Liberty Seguros, afirma que o tamanho do prejuízo do setor só começará a ser medido em um mês:

- Mesmo sem informações disponíveis, acredito que será algo na casa dos US$50 bilhões. Agora é que começamos a ter uma dimensão melhor do terremoto do início de janeiro na Nova Zelândia, e fala-se em pagamentos de seguros entre US$15 bilhões e US$20 bilhões.

Os números das contas externas do Brasil refletem a longa e sólida tradição de intercâmbio econômico com o Japão, favorecido pela ampla colônia japonesa no país. Em 2010, o Japão respondeu por 4,7% de todos os investimentos estrangeiros para o setor produtivo feitos no Brasil. Também é relevante o volume de recursos enviado para cá por brasileiros que moram no Japão, que chegaram a US$717,2 milhões em 2008. Nos dois anos seguintes, esse fluxo perdeu força porque os trabalhadores do Japão sentiram pesadamente os efeitos da crise financeira global: muitos até perderam o emprego e voltaram para o Brasil. Em 2010, foram US$363,5 milhões.

Cotação do petróleo tem queda de 1,4%

O Brasil exporta para o Japão basicamente commodities, como minério de ferro, carne de frango, alumínio, café e soja. Já as importações de produtos japoneses se concentram em veículos e componentes eletrônicos. O setor eletroeletrônico japonês, aliás, pode sofrer um baque que afetaria toda a cadeia de produção global, segundo a consultoria IHS iSuppli. O Japão, segundo a empresa, responde por 14% de toda a cadeia global desse setor.

Os preços de diversas commodities recuaram ontem. Os contratos futuros de milho fecharam em queda de 2,7%, e os de trigo, de 2,9%. A soja recuou 1,5%, e o arroz, 0,3%. Até as cotações do petróleo, que vinham sendo pressionadas pelos protestos nos países árabes, fecharam em queda. O barril do tipo Brent caiu 1,4%, para US$113,84. Já o do tipo leve americano recuou 1,5%, para US$101,16. Segundo analistas, isso se deveu ao fato de o Japão ser o terceiro maior consumidor de petróleo do mundo e pela paralisação de diversas refinarias, como a Cosmo, perto de Tóquio, que estava em chamas.

As bolsas também refletiram a tragédia. Tóquio recuou 1,7%, e projeta-se queda maior na segunda-feira. Hong Kong caiu 1,5%, e Xangai, 0,8%. Em Londres, a queda foi de 0,3%, enquanto Frankfurt e Paris caíram 1,1% e 0,9%, respectivamente.

Muitas empresas brasileiras estão no Japão, mas a maior parte se concentra na capital Tóquio, menos afetada pelo terremoto. Lá ficam os escritórios de Itaú e Bradesco, que afirmam não ter sofrido danos significativos. Já o Banco do Brasil, com sete agências no país, ainda não sabe informar o impacto exato da tragédia. A Osklen também não conseguiu mensurar se houve danos em suas duas lojas. A BR Foods informou ter sofrido pequenos abalos em seu escritório em Tóquio.A Vale tem um escritório comercial em Tóquio e uma refinaria de níquel em Matsuzaka, que não foram afetados. A Petrobras tem uma refinaria na Ilha de Okinawa e, segundo a estatal, suas instalações não foram danificadas e seus empregados estão em segurança. A Petrobras tem 200 empregados no Japão.
14 de março de 2011.

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